domingo, 25 de maio de 2014

OS MEUS "ORMONDE" DA ILHA TERCEIRA - RAMO DOS "DRUMMOND" (1ª Parte)


Rosa Bernarda de Jesus foi a primeira das minhas antepassadas a nascer no Rio de Janeiro a 7 de Julho de 1748.

Sabemos pelo registo de casamento de seus pais, Manuel Pimentel de Mesquita e Inácia de Jesus Ormonde, datado de 30 de Setembro de 1743 na freguesia da Candelária no Rio de Janeiro, que era neta paterna de Manuel Pimentel de Mesquita e de Maria Madalena Romeiro da freguesia de Stª Bárbara na Ilha Terceira e neta materna de António Cardoso Arruda e Catarina da Ascensão da freguesia de Cabo da Praia dessa mesma ilha.

Ficámos curiosos quanto ao apelido “Ormonde” de Inácia de Jesus. Esta é uma das formas derivadas do apelido Drummond, muitas resultantes de erros ortográficos perpetuados por sucessivos registos erróneos. No Brasil outra das formas conhecidas é “Armonde”.

Cabo da Praia é uma das freguesias da Vila da Praia (da Vitória) na Ilha Terceira, vizinha da de S. Sebastião, onde residia no início do século XVII, Francisco Ferreira Drummond, natural da Madeira e do qual descendem a maioria dos Drummond, Ormonde e Armonde da Ilha Terceira e também muitos dos destes apelidos que passaram ao Brasil no decurso dos séculos XVIII, XIX e XX.

Para tentar desvendar as origens do apelido Ormonde da minha primeira avó carioca, começámos as nossas investigações pelos registos paroquiais da freguesia de Stª Catarina do Cabo da Praia.

Começamos por procurar o assento de baptismo de Inácia de Jesus.


Livro de Registos de Baptismos de Stª Catarina do Cabo da Praia; 21.10.1709
"Inácia filha de António Cardoso e de sua mulher Catarina da Ascensão moradores nesta freguesia do Cabo da Praia e fregueses desta Paroquial de Stª Catarina, nasceu aos quinze dias do mês de Outubro do ano de mil setecentos e nove foi baptizada nesta dita igreja de Stª Catarina de seus pais aos vinte e um dias do mês de Outubro da sobredita era por mim joão Vieira Borba vigário da dita igreja. Foram padrinhos João Martins Arruda casado com Beatriz Coelho de Lima e Brasia da Trindade casas com Guilherme Ferrão moradores nesta freguesia do cabo da Praia e fregueses desta paroquial de Stª Catarina. Testemunhas presentes Gonçalo Martins e Francisco Vieira e por ser verdade fiz este termo que assinei com as sobreditas testemunhas neste dia mês e ano"


No livro de registos paroquiais de Stª Catarina do Cabo da Praia, consta a 21 de Outubro de 1709, o assento de baptismo de Inácia, filha de António Arruda e de Catarina da Ascensão. Inácia nasceu a 15 de Outubro desse mesmo ano de 1709. No referido assento não são mencionados os avós.


Fomos depois à procura do assento de casamento de António Arruda e Catarina da Ascensão.



Livro de Registos de casamentos de Stª Catarina do Cabo da Praia; 24.05.1694
“Em os vinte e quatro dias do mês de Maio do ano de mil seiscentos e noventa e quatro ......recebeu o cónego Alexandre da Costa Mendes...Concíçio Tridentino, com minha assistência... a António Cardoso, viúvo de Catarina.. de Borba com Catarina da Ascensão em S. Bento Extramuros da cidade de Angra..."


Nele se refere que casaram a 24 de maio de 1694, sendo António Cardoso Arruda viúvo de Catarina...de Borba. Não é feita menção aos pais de nenhum dos noivos.

No assento do primeiro casamento de António Arruda afirmava-se que era filho de Gonçalo Martins Cardoso e de Maria Luís de Stª Catarina do Cabo da Praia. Através destes dados foi possível estabelecer a ascendência do pai de Inácia de Jesus Ormonde.

António Cardoso Arruda nasceu em 1660, tendo sido baptizado a 30.05.1660. Era filho de Gonçalo Martins Cardoso (bp a 27.05.1618) e de Maria Luís (bp 10.09.1627), moradores no Porto Martins. Neto paterno de Gaspar Martins e de Catarina Antunes e neto materno de Manuel Pires Arruda e de Catarina Roiz. Era descendente por parte de pai da família Gago e por parte da mãe, da família Arruda, mas isso é outra história.

Não tendo sido identificado nenhum antepassado, via paterna, com o apelido Ormonde ou Drummond, parecia pois óbvio que o apelido teria origem materna. Tinhamos chegado a um beco, aparentemente, sem saída.

Nos registos do cabo da Praia e de S. Sebastião e ainda de outras freguesias próximas no final do século XVII, encontramos muitos “Ormonde” mas não era possível estabelecer uma relação com a nossa Catarina da Ascensão.

Decidimos então procurar os registos de todos os filhos do casal. De 1694, data do seu casamento, em diante, encontrámos o assento de baptismo de doze filhos de António Cardoso Arruda e Catarina da Ascensão. O último dos quais nascido já em 1720.

1.  João Martins Ormonde – baptizado em Stª Catarina do Cabo da Praia a 03.05.1695, tendo sido padrinho, João Romeiro de Stª Bárbara das nove Ribeiras.
2.    Francisca Rosário dos Anjos – baptizada em stª Catarina do Cabo da Praia a 07.10.1696
3.    Miguel – bp 26.09.1698
4.    Brasia – bp 28.01.1700
5.    Antónia – bp 15.10.1701
6.    António Cardoso – bp 15.05.1703 e falecido a 05.07.1720
7.    Beatriz – bp 03.07.1705
8.    Bento – bp 18.05.1707
9.    Inácia de Jesus Ormonde – foi baptizada em Stª Catarina do Cabo da Praia a 15.10.1709; passou ao Brasil, tendo casado em 1743, com 33 anos, no Rio de Janeiro, com Manuel Pimentel de Mesquita. Foram eles os pais de Rosa Bernarda de Jesus Ormonde, a minha primeira avó carioca.
10.  Luzia – bp 04.01.1712
11.  Maria – bp 20.08.1714
12.  Felix – bp 23.12.1719

Os assentos de baptismo podem ser uma fonte de informação importante, pois mencionam frequentemente a freguesia de origem dos progenitores assim como os nomes dos padrinhos de baptismo e outras testemunhas. Os padrinhos são em geral escolhidos pelas relações familiares com a família do baptizado, ou então pela sua importância na comunidade ou relevância social.

Quando os padrinhos são escolhidos pelo seu prestígio social, são uma presença frequente, numa determinada época, nos diversos assentos de baptismo da freguesia e quase sempre são aí residentes.

Pelo contrário, os padrinhos escolhidos por relações familiares em regra apenas surgem nos assentos daquela família e nem sempre são residentes na mesma freguesia da família do baptizado. Por vezes são referidos os laços familiares existentes (tio, avô, etc).


No baptizado do primeiro filho, João, a 03.05.1695, é referido como padrinho, João Romeiro da Costa, da freguesia de Stª Bárbara das Nove Ribeiras. Não volta a ser mencionado noutros registos da freguesia de Cabo da Praia. Isto, associado ao facto de vir propositadamente de uma outra freguesia para ser padrinho, sugere que possa haver uma relação familiar.

No assento de baptismo dos dois últimos filhos do casal é referido que Catarina da Ascensão era natural da mesma freguesia de João Romeiro, ou seja de Stª Bárbara das Nove Ribeiras o que reforça a hipótese já levantada de haver uma relação familiar.

Decidimos também consultar os assentos de óbito da freguesia de Cabo da Praia e encontramos o registo do óbito de António Cardoso Arruda a 13.01.1744 e de D. Catarina da Ascensão a 03.09.1743.


Livro de registo de Óbitos de Stª Catarina do Cabo da Praia - 03.09.1743
"Em os três dias do mês de Setembro deo ano de mil setecentos e quarenta e três faleceu da vida presente D. Catarina da Ascensão mulher de António Cardoso Arruda natural de Stª Bárbara das nove Ribeiras e freguesa desta Igreja de Stª Catarina do lugar do Cabo da Praia da idade de Sessenta (?) anos, pouco mais ou menos. Recebeu todos os sacramentos da Madre Igreja, não fez testamento.......foi amortalhada em hábito de S. Francisco, acompanhada com o colégio desta dita Paroquial de Stª Catarina e enterrada na Igreja de S. Francisco da Vila da Praia..."


No assento de óbito de Catarina da Ascensão, é referido que era natural de Stª Bárbara das Nove Ribeiras, era mulher de António Arruda, e tinha “sessenta” anos “pouco mais ou menos”. Trata-se provavelmente de um erro ortográfico pois se assim não fosse D. Catarina da Ascensão teria casado com apenas 10 anos e tido o primeiro filho com 12 anos o que nos parece improvável. O mais certo é ter falecido com setenta anos “pouco mais ou menos”, casado com 20 e tido o último filho aos 45 anos.

Com base neste pressuposto, decidimos pesquisar os assentos de baptismo da freguesia de Stª Barbara das Nove Ribeiras entre 1670 e 1683.

Dos assentos encontrados não foi identificado o apelido “Ormonde” em nenhum dos progenitores. Contudo, despertou a nossa atenção, um registo em muito mal estado de conservação, em que é referido o baptismo a 11.05.1673 de Catarina, filha de Brás (?) e de (?) Gato.


Registos Paroquiais de Stª Bárbara das Nove Ribeiras, Ilha Terceira, Açores
Lv de Bp 1658-1673/f93

"Em os onze dias do mês de Maio.................

seiscentos e setenta e três baptizei..............

das nove Ribeiras a Catarina filha de Brás...
Gata. Foram padrinhos..................................
mulher de Manuel Dias fregueses................"


O apelido Gato aguçou a nossa curiosidade, pois Francisco Ferreira Drummond, que mencionámos anteriormente, foi casado a primeira vez com Bárbara Gato Machado, de quem teve diversos filhos.

Como o assento de baptismo estava incompleto, fomos à procura de outros filhos do casal Brás….. e …..Gato e encontrámos, Maria baptizada em Stª Bárbara das Nove Ribeiras a 16.12.1668 e Isabel, a 01.09.1671, filhas de Brás Gomes e de sua mulher Bárbara Gato. Ficámos assim a saber o nome dos pais da Catarina nascida a 11.05.1673 em Stª Bárbara das Nove Ribeiras.


Nos registos de casamento de Stª Bárbara, não há menção ao casamento de Brás Gomes com Bárbara Gato. Há sim referencia a uma outra Bárbara Gato que casou por duas vezes em Stª Bárbara, mas que não pode ser a mesma pois ambas tiveram filhos em períodos idênticos. A Bárbara Gato casada com Brás Gomes, seria assim provavelmente natural de uma outra freguesia, justificando-se assim o seu casamento noutra localidade. Infelizmente a freguesia de S. Sebastião de onde são originários os Drummond descendentes de Francisco Ferreira Drummond não tem registos de matrimónios anteriores a 1673.

Encontramos o assento do segundo casamento de Bárbara Gato, sem menção do nome dos pais, sendo ela referida como viúva de Brás Gomes. Casou em Stª Bárbara a 03.05.1676 com João Machado.

Fomos então tentar encontrar os registos de casamento das filhas de Brás Gomes e de Bárbara Gato na freguesia de Stª Bárbara. Não encontrámos o assento de casamento de Catarina, o que sugere que tenha casado noutra freguesia.


Registos Paroquiais de Stª Bárbara das Nove Ribeiras, Ilha Terceira, Açores
Lv de casamentos -21.07.1690 (casamento de João Romeiro, viúvo e Maria machado, filha de Brás Gomes e Bárbara Gato)
 


Encontramos o casamento de Maria Machado filha de Brás Gomes e de Bárbara Gato  a 21.07.1690de 1690 com João Romeiro da Costa. Este é o mesmo que vem a ser padrinho do primeiro filho de Catarina da Ascensão e de António Cardoso Arruda.

Por outro lado, encontramos num assento de batismo de Stª Bárbara a referencia a Isabel de Ormonde, filha de Brás Gomes, como madrinha.

Os apelidos “Ormonde” e “Machado” estavam assim identificados nas filhas de Brás Gomes e Bárbara Gato de Stª Bárbara das Nove ribeiras.

No assento de baptismo de um dos filhos de João Romeiro e Maria Machado, a 20.05.1696 em Stª Bárbara, foi madrinha Joana da Ascenção, filha de Brás Gomes e de Bárbara Gato. E no de outro filho, António, a 09.05.1694, é referido como padrinho António Cardoso freguês de Stª Catarina do Cabo da Praia. O mesmo António Cardoso que casa com Catarina da Ascensão, nesse mesmo mês de Maio, mais precisamente a 24.05.1694 na freguesia de Stª Catarina do Cabo da Praia.

Estava pois confirmada a relação entre as duas famílias e os dados conhecidos apontam para que a Catarina da Ascensão que casou com António Cardoso, seja a Catarina, filha de Brás Gomes e Bárbara Gato.

A chave do apelido Ormonde parecia pois residir na mãe de Catarina. Seria ela a transmitir o apelido Machado à sua filha Maria e Ormonde à sua filha Isabel e também à Catarina da Ascensão que por sua vez o transmitiu á sua filha Inácia de Jesus, mãe da minha primeira avó carioca.

Faltava pois estabelecer a relação com os Drummond de S. Sebastião. Consultando o capítulo dedicado aos Drummond na obra “Genealogias da Ilha Terceira”. Vol IV, de António Mendes e Jorge Forjaz, constatamos que Francisco Ferreira Drummond, de S. Sebastião e sua primeira mulher, D. Bárbara Gato Machado, tiveram vários filhos:

1.     Sebastião Gato Ferreira
2.     Manuel Machado Drummond (que segue)
3.     D.Violante
4.     D.Luzia machado
5.     D.Isabel Gonçalves
6.     João Ferreira Drummond (bp em S. Sebastião a 29.06.1618)     
7.     D. Ana Ferreira Drummond (bp em S. Sebastião a 26.07.1616
8.     António Ferreira Drummond (nasceu em 1620)

Manuel Machado Drummond, nasceu na primeira década do século XVII e veio a casar  cerca de 1637 com D. Maria Pacheco de quem  teve diversos filhos.

1.     Francisco (bp em S. Sebastião a 23.04.1635)
2.     D. Maria Ferreira Drummond (bp em S. Sebastião a 24.10.1638)
3.     Domingos (bp em S. Sebastião a 15.07.1640)
4.     D. Bárbara (bp em S. Sebastião a 06.09.1644) tif 235
5.     Manuel machado Drummond (bp em S. Sebastião a 02.01.1651)
6.     João machado Drummond

De alguns deles é conhecida a descendência, contudo de D.Bárbara, nascida em 1644, apenas se conhece o que consta do seu assento de baptismo.

Registos Paroquiais de S. Sebastião - Lv de Baptismos 06.09.1644
" Em os seis dias de Setembro de 1644 baptizei a Bárbara, filha de Manuel Machado e de sua mulher Dona Maria. Foram padrinhos Sebastião Gato Valadão e ...

Como já afirmámos, não há registos de casamento em S. Sebastião anteriores a 1673, pelo que não foi possível confirmar se esta Bárbara, neta de Francisco Ferreira Drummond e de Bárbara Gato Machado é a mesma Bárbara Gato casada com Brás Gomes, mãe de Isabel de Ormonde, Maria Machado, Catarina da Ascensão e Joana da Ascensão. Como já dissemos antes também não encontramos, em Stª Bárbara, o casamento de Bárbara Gato com Brás Gomes, o que leva a supor que a noiva seria de outra freguesia, onde teria casado.

Cronologicamente tudo batia certo e os factos já referidos em tudo apontavam para que esta hipótese fosse a verdadeira. Bárbara Gato seria filha de Manuel Machado Drummond e de D. Maria Pacheco, neta de D. Bárbara Gato, nascida em S. Sebastião em 1644, teria casado cerca de 1666 com Brás Gomes. Deste casamento nasceria em 1673 Catarina da Ascensão, que casou em 1694 com António Cardoso Arruda da freguesia de Stª Catarina do Cabo da Praia, onde nasceu em 1709, Inácia de Jesus Ormonde.

Na consulta dos registos paroquiais, iríamos encontrar um outro facto que reforçava ainda mais a veracidade desta dedução.

Ao investigar João Romeiro da Costa, casado com Maria Machado, filha de Brás Gomes e de Bárbara Gato, e que foi padrinho do primeiro filho de António Cardoso Arruda e de Catarina da Ascensão, constatámos que era irmão de Madalena Romeiro mãe de Manuel Pimentel de Mesquita que na década de 40 do século XVIII, passou ao Brasil, mais precisamente ao Rio de Janeiro, onde casou com Inácia de Jesus Ormonde, filha de António Cardoso Arruda e de Catarina da Ascensão.

Manuel Pimentel de Mesquita era sobrinho de João Romeiro. Catarina da Ascensão era sobrinha de Maria Machado, mulher de João Romeiro. Estaria assim explicada a ida de Inácia de Jesus Ormonde com Manuel Pimentel de Mesquita para o Rio de Janeiro e o seu casamento em 1743.

Tendo em conta todos os dados apresentados afigurasse-nos como muito provável a veracidade da dedução genealógica que atribui a progenitura de Catarina da Ascensão a Brás Gomes e Bárbara Gato da freguesia de Stª Bárbara das Nove Ribeiras e o entroncamento, por via materna, nos “Drummond” de S. Sebastião, explicando assim o apelido “Ormonde” da minha primeira avó carioca.


O fascínio de investigar, cruzar dados, estabelecer relações e interpretar acontecimentos que passam a ter uma outra dimensão, fazem da genealogia uma ciência fascinante. Esperamos ter aqui conseguido transmitir um pouco deste fascínio que justifica as inúmeras horas de dedicação e paciência, nem sempre entendidas pelos outros. Quem gosta de construir puzzles talvez entenda o que queremos dizer, só que aqui, para além do prazer de conseguir completar o puzzle temos a gratificação imensa de conhecer melhor a nossa história. E sempre que se completa um puzzle, outros ficam por resolver.